Passeavam
corpos, corpos esses sem ninguém lá dentro. Os legítimos donos ,ausentes, sabe-se lá onde
ou para quê tinham deixado à deriva, entregues a automatismos diários, sem
supervisão ou vida, apenas isso: corpos. Olhos pousados no asfalto- ou na
tecnologia?- prosseguiam, contudo, a rotina sem prendarem o mundo com a sua
presença. Seriam cadáveres? Cadáveres não eram pois mexiam- os cadáveres não
mexem…
Eram
pretos e brancos, vermelhos e amarelos- sem serem muito garridos, claro!- mas
todos sem exceção vinham vazios de gente. Onde andariam aquelas almas
perdidas? Viajavam. No passado ou
futuro. Mas sempre ausentes da vida. Quem lha poderia restituir antes que fosse
tarde?
Andar,
andavam. Paravam nos semáforos- mas não paravam para se ajudar uns aos outros-
apressados, sempre apressados e ocupados. Ocupados com tão pouco daquilo que
vale a pena, mas acreditavam que sim, que valia o sacrifício com que entregavam
a vida aos apelos de um mundo sempre exigente e chamativo. Viajavam pelo tempo-
passado e futuro- , mas ausentes do presente e ausentes de si. Eram impelidos
por uma força maior que puxava, puxava para que andassem sem parar, mas eram
apenas e só autómatos e escravos, escravos do tempo.
Já
nem corpos eram. Também já não viajavam no tempo. Mas continuava a não haver
ninguém dentro dos corpos inexistentes. Não existia nada. Mas andavam, paravam
nos semáforos- e já nem se viam uns aos outros- perdidos num mundo inexistente.
Nasciam e morriam, sem viver…
Maria João Varela
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