domingo, 16 de setembro de 2012

Tsunami



Gostei de ver o povo português assim unido num protesto; até os mais relutantes saíram à rua: eu não.  Não fui. Não que prefira qualquer outra tarefa mais interessante mas, simplesmente, porque me identifico completamente com as palavras de Madre Teresa de Calcutá quando diz: “ convidem-me para manifestações que digam sim à paz e eu irei, agora contra a guerra; jamais! Porque aí o ênfase é dado à guerra.
Ouvi  muitos dizerem que querem outro 25 de abril mas, a meu ver, e como já diz o ditado o rio não passa duas vezes no mesmo sítio querendo com isto dizer que jamais as condições serão idênticas e vejo muitas diferenças daquela época para esta  e dos interesses diferentes que estavam em jogo. Uma das diferenças mais relevantes diz respeito àquilo que as pessoas queriam e ao facto de saberem exatamente o que queriam, e agora, saberão? E eis-me chegada ao motivo principal porque não me juntei à população: sei perfeitamente o que as pessoas – eu incluída – não querem, mas o que querem elas? Quererão que saia o PSD para voltarem a colocar no seu lugar o PS?
Só ouço que não queremos mais desemprego, não queremos troika, não queremos passos coelho – com minúscula e tudo – não queremos muita coisa, mas o que queremos no fim de contas?
Diz-se que a necessidade aguça o engenho e tenho que reconhecer que aqui o povo português foi de uma criatividade sem par, os cartazes, empunhados por furiosas mãos – algumas cansadas de tanto trabalho sem o justo contributo – tinham verdadeiras obras de arte indo do humor negro  ao sarcasmo  mais corrosivo como se todos nós tivéssemos já nascido para isto: fazer cartazes e empunha-los e , segundo consta, muito do que se viu foi espontâneo tendo as pessoas começado a juntar-se sem que nada fizesse prever  o impacto numérico – ainda por cima num sábado de verão como este em que noutras circunstâncias estariam todos de papo para o ar a ouvir o famoso refrão: “ Olha a bolinha de Berlim, croissant d’ovo…”  «Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades» como dizia  Camões.
Confesso-me um pouco envergonhada por ver tanta gente que luta, que pede mudança, que diz “Não”, que diz “Basta” e eu aqui fiquei assim, impotente, petrificada, sem me apetecer mexer; a verdade é que não sei bem o que quero e como quero. Não sei que partido lá quero, não sei que medidas me assustam mais se estas em que claramente o país vai ao fundo dentro em breve, se outras em que tudo é suposto ficar como até aqui; eu só sei que nada sei – como Sócrates, o filósofo, porque o outro sabia e era muito…
Pois, e assim continuo sem saber se quero esquerda se direita, se Monarquia ou República, anarquia ou ditadura, se sol ou chuva, frio ou calor,  fome ou gula. Mas quero dizer “Sim” e não dizer “Não”, pois no dia em que soubermos para onde queremos ir, nesse dia, será dado o passo sem retorno e aí será um tsunami e não uma onda de gente.


sábado, 8 de setembro de 2012

viciada em livros


Dizem que os livros são como um amigo, qual amigo qual quê; um livro, ou os livros neste caso, foram a mãe, o pai, os irmãos, a família inteira… não saberia viver sem eles. Nunca escolhi nenhum, foram sempre eles que me escolheram a mim, insinuando-se com as suas sedutoras  capas de cores brilhantes. O bailado das letras agarra-me, hipnotizando-me, e já só me vejo a dizer à livreira: “ quero este!” e pronto, já está. Lá me leva ele para casa e já não mais me larga até que acabe de o desfolhar  primeiro, devagarinho , como quem tateia um mundo desconhecido, tomando conhecimento do seu cheiro único – é isso, acho que é o cheiro que resolve o dilema com que me deparo às vezes quando, indecisa, demoro a escolher – do tamanho das letras e número de páginas e não faz mal se são muitas, só não me chateiem até que acabe de o devorar.
Cresci a ler, saí cedo da escola, mas nunca me faltaram livros; comida sim, às vezes, mas livros nunca. Se as pessoas se medissem em cima das pilhas de livros que já leram em vez de descalças como normalmente, eu seria enorme, seria uma top model sem rival… às vezes penso que não fui formatada na escola e por isso dou por mim a pensar diferente, sem falsas modéstias, eu penso diferente e a culpa é deles, ou melhor dos seus autores, pessoas de todo o mundo, e eu cresci assim a ler pessoas de todo o mundo,  sem a pressão dos exames podia ler e reler vezes e vezes sem conta e refletir no que lia sem que alguém me dissesse que estava na hora de fazer um exame e deixar de pensar no assunto.
Só já na vida adulta me sujeitei aos exames que fui passando, mas já nada havia a fazer a minha mentalidade universal estava já formada, por isso sinto-me cidadã do planeta terra que eu adoro, mas não gosto de patriotismo bacoco. Quem lê e lê muito e reflete no que lê é mais tolerante porque conseguimos ver sob muitas perspetivas diferentes:  O famoso “Madame Bovary”  de Gustave Flaubert que pelos olhos de uma adúltera nos mostrava a fragilidade humana que conseguia ter  alguém que assim enganava o pobre Charles, o marido; Eça de Queirós com o seu fiel retrato da sociedade portuguesa do séc. xıx que se mantém, infelizmente, atual; Os irmãos Frochard de Arsène Blanc que li e reli vezes sem conta com uma lanterna a pilhas por debaixo do lençol -  não que me proibissem de ler, mas porque não tinha eletricidade -  e que me fez viajar por todo o mundo vendo através dos olhos perspicazes do autor que  contava como, por sua vez, as suas personagens viam o mundo, e eu sonhava, vivia uma realidade difícil mas sonhava e sabia que havia um mundo melhor do que o meu e bem maior . A imaginação soltava-se e eu estava ali sem estar. Nada, nunca, pode substituir um bom livro.
Por isso sou rica, rica não, milionária, bilionária, não trocaria todas estas experiências por nenhuma riqueza “ material” deste mundo, deveria mesmo existir uma revista como aquelas que existem para medir a riqueza material e que medisse o número de bons livros que alguém já leu e o número de horas que refletiu sobre eles, estaria entre os primeiros lugares , não tenho dúvida nenhuma.
 Ler, pensar,  “digerir” as ideias expostas e torna-las nossas e depois, só depois, deixar que a boca se abra, ou a mão escreva  o que se pensa sobre a questão porque aí sairá uma ideia novinha em folha , o conhecimento assim absorvido quando divulgado já sairá de roupagem nova  já lhe terá sido acoplado algum do conhecimento único que cada pessoa contém  criando assim conhecimento totalmente novo. É assim, a meu ver, que uma sociedade evolui e não divulgando o conhecimento tal e qual ele se encontra exposto.
imagem retirada da net

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Semente venenosa




Estamos a viver num país em que todos culpam todos e nunca ninguém se senta  e, sozinho com os seus botões, se pergunta onde foi que eu errei? Que posso fazer daqui para a frente para que tudo corra melhor? É muito fácil criticar, já assumir responsabilidades é sempre muito difícil, no entanto, é o único caminho para a mudança.
 Onde foi que errámos? Onde continuamos a errar? Que passos devemos dar para a mudança ocorrer? Estas perguntas deveriam ser respondidas por cada um de nós. Já não há paciência para criticas, acusações, sentimentos de injustiça, indignações; onde é que isto nos leva? A lado nenhum, só se consegue aumentar o desconforto pela situação, mais nada. 
Numa reportagem que li a propósito da Islândia e das mudanças que tinham feito, lembro-me que uma das coisas que mais me impressionou foi o facto de eles praticamente não se queixarem, no entanto, saíram para a rua e mudaram as coisas, porque será? Que têm eles que nós não temos?  Nós falamos muito e agimos pouco e para nós os outros são sempre os culpados e nós próprios somos uns anjos na terra. Onde estão as mães e pais desta geração? Onde estão os que educaram estes que, agora chegados  ao topo, açambarcam os restos que ainda há para açambarcar tal qual  cães vadios que revolvem os fundos dos caixotes do lixo buscando, esfaimados, o que sobrou das copiosas refeições de outrora? Eu respondo, estão por aí, estão por todo o lado, ao nosso lado, somos nós; por mais que custe, somos nós…
Sempre que educamos no sentido dos nossos filhos levarem vantagem, de serem os melhores, quando fazemos comparações: “ Já viste  as notas do filho da “C”? Tens de te esforçar para seres melhor do que ele  para a próxima; Já viste o namorado da “I” ? A família dele é dona de metade cá da terra, se ao menos tu também arranjasses um assim”; “o vizinho comprou um carro novo, deve ter custado um balúrdio, está na hora de trocarmos o nosso…”, sempre que o fazemos estamos a incentivar a mentalidade que combatemos depois, naqueles que, tendo o poder, mais não fazem do que seguir o que lhes foi ensinado. É bom que nos consciencializemos de que sempre que valorizamos alguém simplesmente por aquilo que acumulou, por aquilo que tem, pelas vantagens que alcança estamos a incentivar as novas gerações a manter esta mentalidade que nos está a afundar.
Comparações, a existir, devem ser feitas olhando para aquilo que éramos e que agora somos; ou que os nossos filhos eram e são agora, valorizar o esforço e não os resultados, valorizar atitudes e não bens acumulados, aceitar diferenças e “fraquezas” ajudando a melhorar , incutir outros valores.
Os responsáveis pela nossa situação somos todos nós, com os nossos comentários,  atitudes pouco refletidas  e quando mais depressa o aceitarmos mais depressa começaremos a mudar este país que continua o mesmo que  Eça de Queirós imortalizou. Façamos cada um  Mea culpa  e comecemos a educar os nossos filhos de forma diferente e, na próxima geração teremos um país melhor, pois ou muito me engano ou podemos  mudar de governo todos os dias e mesmo assim até ao final do século nada mudará porque a semente venenosa é deitada à terra, todos os dias, por todos e cada um de nós.




(imagem retirada da net)

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Partir e chegar



Seria bom estarmos sempre de partida e sempre de chegada… nada se compara a um cenário observado pela primeira vez;  aos sons que ouvimos estranhando os graves e os agudos, os sussurros  das notas cantadas pela natureza e que, estando lá sempre, pelo menos a nós que agora chegámos, nos parecem de uma beleza que passa despercebida a quem já se habituou.

E é este “habituar” que é preciso contrariar, é este acostumar embrutecendo o que é belo que urge combater. Como os sentidos despertam quando contemplamos uma paisagem pela primeira vez!  Como os aromas nos parecem únicos e de um prazer sem começo nem fim que nos atordoa e faz a vida valer a pena!  Partamos, pois. Não importa para onde, mas partamos para podermos chegar e saborear como uma criança saboreia um fruto doce pela primeira vez.

A partida, essa, também tem o seu encanto. É quando queremos tudo abarcar pois já nos falta o que ainda temos;  temos sem ter, já não sentimos nosso o que está diante de nós e mesmo a olhar, tocar, sentir, mesmo assim não é nosso. Até o doce nos parece mais doce e a brisa mais fresca, o que era feio agora é  bonito e o aborrecido ganha novos encantos descobertos à última  hora enquanto  perguntamos porque não olhámos com mais atenção enquanto havia tempo… Agora já não há. Resta a nostalgia e a leve esperança de regressarmos um dia e vivermos o que nos faltou viver agora. Só que esse dia nunca chega; mas nós chegamos a algum lugar, aproveitemos então enquanto é tempo o raro despertar dos sentidos e nunca, mas nunca, nos deixemos “habituar”.
















(imagem retirada da net)