segunda-feira, 27 de maio de 2013

Depressão

Sim, conheço o breu  dos dias sem esperança e sem futuro. Nada pior. Nada maltrata mais do que olhares em frente e não teres caminho para caminhar nem coragem para o construir. A isso chamam depressão. Ai, a angustia dos dias que não passam, sim passam, mas nem te apercebes pois são todos iguais, todos monótonos, todos de dor feitos, todos indistinguíveis, incolores, insalubres, insípidos…
Olhas, mas não vês, ouves, mas não sentes o vibrar das ondas; nada queres, nada desejas, não te importas…
Conheço de cor o cansaço de quem pensa: para quê? Para onde?  Sem encontrar sentido nas próprias questões que ficam sem resposta; conheço a vontade de desistir só pelo cansaço que é o simples ato de pensar.
Conheço o caminho de pequenos passos em direção à reconstrução de um passado, presente e futuro ah, o futuro. Sem o futuro em mente ando, ando , mas só em círculos, viciosos.  Conheço o lento despertar do estado de hibernação, a primeira e quase impercetível alegria do raio de sol que vem pousar e acariciar a pele até ali insensível a estas e outras manifestações.
Sei, sei bem o que é sentir o redescobrir do saltitar das papilas gustativas respondendo a um sabor que se intensifica pela simples razão de ter estado adormecido. Sei a sensação, quase de criança que pela primeira vez aprecia o aroma das maçãs maduras ou do pão torrado pela manhã.
Tudo volta aos poucos, a alegria, a esperança, os dias com propósito e preenchidos; e uma enorme vontade de poder ajudar quem ainda se encontra na hibernação dorida e cansada dessa viagem ao interior vazio de uma mente assombrada por fantasmas que parecem reais, mas não são: ao primeiro sinal de determinação fogem para longe.




sexta-feira, 24 de maio de 2013

Défice de atenção com hiperatividade: simplesmente uma ficção?


Depois do psiquiatra Leon Eisenberg, o americano e  pai da  temível sigla ADHD ( o famoso défice de atenção com hiperatividade) vir dizer pouco antes de morrer- num rasgo de remorso com certeza pelas repercussões nefastas que tem tido uma tal ficção- com a idade de 87 anos que tudo não passava de ficção : “ADHD is a prime example of a fictitious disease” , pergunto: vão os pais continuar nesta loucura coletiva que se tem traduzido nos últimos anos em mais e mais crianças medicadas para o que não passou de um abuso das indústrias farmacêuticas e de alguns profissionais de saúde mental?
Foi-se demasiado longe, a meu ver, no que diz respeito a ter uma criança perfeita: a que se senta direita quando a mandam; responde sempre sim, está penteada, limpa e sei lá que absurdos mais.
Não tem tempo para ser criança com tarefas curriculares e extra curriculares que lhe impõem e que ainda por cima vive continuamente em caixas( a casa, o carro, a escola) quase sem contacto com a natureza, não gasta as suas baterias em atividades físicas e tem- muitas vezes- que “levar” com os desequilíbrios dos pais. Se a tudo isto aliarmos uma dieta pobre em vitaminas e recheada de açucares aqui está a receita certa para a loucura e mau comportamento.
Qual a solução? Ritalina ou outro do género que como diz  o suíço Otfried Höffe presidente  da comissão ética de biomédica : “ o consumo de fármacos alteram o comportamento das crianças sem que elas contribuam para tal” ; ou seja é uma mudança artificial.
Ainda se pode ir a tempo de salvar uma geração do fracasso total pois não é possível que uma geração em que um determinado tipo de comportamento  foi imposto de forma tão radical, artificial e com tantos efeitos secundários possa algum dia vir a ser funcional.
Um estudo da universidade da Califórnia mostra, por exemplo, que as crianças que meditam durante 30 minutos por  dia, duas vezes por semana- durante pelo menos 8 semanas-  melhoram efetivamente a memória, a atenção, além de diminuir a impulsividade e melhorar o estado emocional geral. Além de outras capacidades cognitivas.
Uma solução prática, barata e saudável que está a ser implementada em muitas escolas dos EUA e que espero ver por cá o mais brevemente possível. Assim haja vontade de fazer alguma coisa pelas nossas crianças.
Já o Dalai Lama diz que se acabaria com a violência numa década se as crianças de 8 anos começassem agora a meditar.



quinta-feira, 16 de maio de 2013

Certificações e outras aptidões


As pessoas gostam de ser enganadas, gostam que alguém surja como salvador de qualquer coisa- será o síndrome do sebastianismo?-vá de encontro aos seus medos, angústias ou quiçá expectativas goradas e num ápice põe de parte as regras mais básicas do raciocínio crítico e cai na esparrela de algum bom falante.
Hoje em dia, com o google, num fechar de olhos temos uma resposta bem elaborada, um comentário a uma questão, um autor citado sem que a pessoa que comenta faça a menor ideia daquilo que está a falar; surgem cursos e certificações nas mais diversas áreas cujas entidades certificadoras têm origens mais que obscuras senão mesmo estranhas. E não se pense que isso se passa  em áreas pouco reconhecidas ou de pouco valor intelectual; não, passa-se exatamente em áreas onde seria suposto as pessoas terem sido treinadas a serem mais céticas: educação, psicologia, nomes com “neuro-isto e neuro-aquilo” então crescem como cogumelos, estrangeirismos para dar ares de grande conhecimento; pobres portugueses continuam com os síndromes já detetados por Eça de Queirós no século XIX.
Entramos então num paradoxo sem igual na história, onde muitas vezes pessoas idóneas, com trabalho sério na sua área de investigação, são desconhecidos ou porque não têm tempo para divulgar o seu trabalho para lá das revistas da especialidade que lhes impõem um ritmo alucinante para poderem subsistir ou então a sua linguagem tornou-se tão técnica que não há leigo que lhe consiga ler uma frase. Não têm jeito para o negócio.
Mas se pensamos que pelo menos a comunicação social será uma área vacinada contra o charlatanismo desenganemo-nos pois muitas vezes não se dão ao trabalho de investigar as suas fontes se a pessoas convidada para comentar um qualquer assunto for bom falante; se trouxer alguma polémica à mistura melhor ainda.
Assim, proliferam como cogumelos certidões e outras aptidões que fariam corar de vergonha o vigarista mais empedernido, não se coíbem de com uma linguagem apelativa,  de que são bons conhecedores isso tem de se dar a mão à palmatória, embriagar os sentidos com uma certificação fácil para temas complexos.
A poucos chegarão as minhas palavras pois não sou doutora- ainda- mas uma coisa me gabo de ter, uma coisa que vejo com tristeza poucos conterrâneos terem: espírito crítico e há coisas que saltam à vista; fazem pop-out mesmo, mas há quem tenha cegueira aprendida. 

sábado, 11 de maio de 2013

Oriente- Ocidente


Um dos melhores exemplos, a meu ver, sobre a aproximação entre o oriente e o ocidente e a melhor forma de cooperação que tem dado uma enormidade de frutos é o facto de se ter conseguido trazer para a agenda científica a investigação sobre valores humanos e também sobre bons sentimentos como compaixão, bondade, felicidade, etc. O facto de em muitas culturas orientais se praticar há milénios o que se chama uma ciência da mente, mas ligada, essencialmente, à religião- ou filosofia de vida- não demoveu alguns pioneiros de a estudarem à luz da cultura científica mais exigente. A meditação sai, assim, do mosteiro para os laboratórios mais bem equipados com a mais moderna tecnologia, mas também o yoga e outras práticas como a prática da compaixão.
Os frutos estão aí: todas as investigações apontam para os benefícios, tanto em saúde como em qualidade de vida, de se investir algum do nosso tempo a cuidar da mente- e de um bom coração- com meditação específica para o incremento de bons sentimentos, por exemplo.
Não há lugar para polaridades que empobrecem a experiência humana; só temos a ganhar em aproximar a visão oriental com a ocidental. Nem é desejável uma vida de eremita ou asceta, sem nenhum conforto material em que se dedicava a vida, somente, ao desenvolvimento da mente, nem uma visão completamente virada para mudar o mundo exterior, em que a acumulação de bens tem conhecido os exageros que conhecemos. No que ao bem-estar humano e felicidade diz respeito parece-me que os dois - mundo externo e interno- são igualmente importantes, estando no equilíbrio entre os dois a salvaguarda de uma vida mais proveitosa, preenchida e significativa.


segunda-feira, 6 de maio de 2013

Noite Coimbrã


Desvirtuada, acolhe no seu seio negros e brancos, homens e mulheres, doutores e caloiros numa amálgama de gente que, libertando-se de amarras imaginárias, encontra no feliz convívio, de álcool  regado, a pausa de responsabilidades ainda não assumidas.
Jaz, Coimbra, trajada e submissa aos encantos da noite e do som das guitarras coimbrãs; despede-se de um bando de andorinhas de chilreios estridentes e ocos cujos sons parecem ecoar o desencanto de quem espera acontecer. Mas nada acontece. E uma vez mais é preciso bater as asas para poder voar.
Quem a vê ao longe, manto de viuvez carregada, viúva alegre é certo, mas como viúva que é traz na alma a angústia que as gargalhadas disfarçam, mas não apagam; acorda solitária e desfraldada sem o encanto de outras festas de esperança carregadas. Assim, a luz da manhã intensifica com o seu brilho a decadência do desrespeito a que foi sujeita; porque te acomodas à tua sorte? 
Impõe-te, ergue-te com o teu orgulho de berço de mentes brilhantes; não deixes que esses bandos te desvirtuem, te revolvam as entranhas e façam da tua imagem o reflexo daquilo que são: egoístas, patéticos e mal formados. Sim, porque ter um canudo não é sinal de caráter.
Ah, andorinhas de capas e batinas! Não há estrada para caminhar nem céus para desbravar .Vai ser preciso conquistar. Construir um novo caminho para prosseguir. Onde está a força da vossa pujança? Foi-se com os gritos das noites e dias sem dormir? Do álcool a rodos? Guardem uma réstia de energia pois os que por vós lutaram estão cansados e esperam ver compensados os seus anos de luta. Agora chegou a vossa vez de bater em debandada, seguirem à frente do bando, cortarem o vento e dizer por onde é o caminho.