domingo, 26 de agosto de 2012

Desencontros



E se hoje eu fosse como sou? Se me deixasse conhecer em toda a minha humanidade tão frágil e trágica quanto deliciosamente única e esplendorosa? Porque insisto  em me  esconder, resisto a mostrar o que me  faz única e ao mesmo tempo  igual? Se ao menos eu soubesse que também tu tremes perante o desconhecido; se imaginasse que também tu te perdes e esvazias de sentido, talvez me deixasse ver por dentro.
Num relampejo de coragem apetece-me descobrir-me do manto pesado e negro que me cobre da ameaça do mundo. E se eu me abrisse? E se eu deixasse descobrires o tesouro tão bem guardado que possuo e que só eu conheço? Ah, mas primeiro, teria de te mostrar a casa dos terrores, dos medos inconfessáveis, dos monstros amordaçados, das léguas por percorrer; teria de dar nome ao deserto da alma e convidar-te a atravessá-lo comigo… quererias tu? Dar-te-ias ao incómodo de partilhares os horrores para descobrires o tesouro?
Foi-se a fugaz coragem, e deixo-me estar assim, envolta na névoa da desconfiança ;querendo falar, calando;  querendo mostrar, tapando ; querendo ser eu,  disfarçando.  E o tempo vai passando, esqueço-me do eu que sou e passo a ser o eu que penso que queres que eu seja. E tu? Tu fazes o mesmo e, embora nos toquemos por ínfimos instantes,  esculpimos abismos, cada dia que passa, mais  e mais escarpados, nunca nos  descobrimos nem encontramos.   

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