O maior monstro de todos os
tempos mascara-se, adapta-se e sobrevive nas sociedades modernas que, tanto o
odeiam como adoram, numa ambiguidade difícil de entender e que permite que ele
alastre e se cristalize criando ramificações, cada dia que passa, mais
profundas e de inumeráveis feitos perniciosos.
Esqueçam a terrífica figura do
Adamastor que tragava barcas e navegadores; este monstro, qual encarnação do
mal, não tem alvo predileto. Avança afetando todos os estratos sociais, todas
as profissões, idades, géneros, não poupa novos nem velhos e tem mil rostos
todos diferentes. É assim tão poderoso porque não podemos viver sem ele, ou
pelo menos sem alguns dos seus efeitos; é velho, muito velho mesmo… sem ele,
nem sequer aqui estaríamos. Por isso mesmo, por aquilo que fez e ainda faz por
nós, ainda lhe devotamos tanto respeito sem levarmos em conta que, hoje em dia,
longe de nos proteger como outrora, usurpou todas as funções que lhe tinham
sido entregues e deturpando-as, subverteu-as a seu bel-prazer e para nossa
ruína.
Quem com ele sofre ou já sofreu
já sabe que falo do “monstro” do estresse. Ele nunca descansa nem deixa
descansar. Traz-nos extenuados, irritados e mal-humorados durante
o dia, atrapalha-nos o sono e também os sonhos durante a noite, afeta os relacionamentos e o trabalho. Esqueçam todas
as outras ameaças: aranhas, tigres, cobras
e lagartos, todos os predadores de quem era suposto ele nos proteger aumentando a acuidade visual, a
força e poder – daí a sua atratividade – é ele o inimigo! Passou de protetor a
protegido pois é ver com que força nos agarramos a esta desregulada vida quando
surge oportunidade de lhe virarmos as costas. Seduz-nos com a sua força que
depois vira depressão, parece manter-nos
vivos para seguidamente com uma facada traiçoeira nos deixar esvaídos em sangue
e com os pés para a cova; não nos deixemos ,pois, iludir , já não temos as
ameaças da selva, bem identificadas, hoje, tudo é uma ameaça. Pelo menos quando
ele – o monstro – toma o poder.
Em seu poder, engordamos, ficamos
carecas e enrugados, temos Alzheimer , somos despedidos e desprezados, temos cancro e
até o nosso sistema imunitário se vira contra nós, ah! E como se não bastasse
já não queremos sexo, perdemos o encanto e o nosso parceiro(a) também ,
desvirtuamos o nosso sangue com gordura e açúcar a mais, quebram-se-nos os
ossos, deformam-se-nos as articulações e os intestinos descontrolam-se, tanto
por defeito quanto por excesso… querem mais? Já chega – para já - que até os monstros têm um pouco de vergonha
na cara.
Este incomensurável monstro dá-se bem encafuado, parado e sempre
atrasado, assoberbado de tarefas múltiplas , em mentes descontroladas; faz-lhe
bem ao ego imaginar mil cenários ameaçadores que nunca se verificam, não relega
responsabilidades ficando com os problemas todos só para ele e, ainda por cima,
nos faz sentir orgulho nisso!
Tem uns quantos inimigos que
sozinhos nada podem contra ele, mas juntos, mantêm-no no seu devido lugar, nas
tarefas que lhe competem – síndrome geral de adaptação ou, por outras palavras
resposta adaptativa de luta ou fuga. É que este é um monstro como outro
qualquer, tem as suas fraquezas. Dá-se mal em contacto com a natureza; não
gosta de ar puro nem de exercício – cansa-se logo e desaparece – nem gosta de
umas boas e descansadas horas de sono nem tampouco de frutas e legumes – argh! –
e não aprecia especialmente uma mente relaxada tipo zen. É isso, agora que lhe
foram descobertas as fraquezas, estaremos preparados para lhe dar caça?
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