As coisas têm a importância que
lhes conferimos; a importância das coisas simples, corriqueiras e banais só nos
apercebemos dela quando um dado artefacto ou objeto de utilidades múltiplas nos
falta. Falte-nos um lenço de papel numa triste hora em que nos apercebemos com
desgosto que o descuido da empregada de limpeza nos deixou- principalmente a
nós mulheres- a balançar numa posição pouco digna e seremos capazes de despejar
todo o valioso conteúdo da nossa bolsa no chão, milhentas vezes pisado, à
procura do dito cujo; que alívio se por descuido jaz um, nem que todo
amarrotado, nos confins da mesma!
Os lenços são dos tais objetos
que só sabemos que existem quando estão ausentes numa hora de aperto, uma hora
em que nos apercebemos que a maldita mudança de temperatura nos pôs o nariz
outra vez a correr em bica por culpa da constipação mal curada: que
constrangimento utilizar disfarçadamente o avesso da manga da camisa para
substituir o supracitado que se sente, agora, vingado pela indiferença com que
tem sido tratado quando buscamos outros objetos mais valiosos, mas bem menos
úteis . Já para não falar das vezes em que distraidamente fazemos uma bolinha
de muco seco e quando nos preparamos para a enrolar bem enroladinha num
imaculado lenço, lá está ele em falta outra vez. Olhamos constrangidos para um
e outro lado à procura de alguém que detetasse este nosso ancestral hábito e
zuca, para nosso descontentamento, vai estatelar-se no chão.
Para quem tem crianças o lenço é
dos objetos mais valiosos e imprescindíveis; não existissem eles e as nossas
maravilhosas crianças passeariam com os pais ao domingo com as beiças
pintalgadas e as mãos lambuzadas; e os narizes? Esses aí convidariam a um
retorno rápido a casa estragando o humor de toda a família…
Pergunte-se a algum cavalheiro de
nobres costumes o que sentiu na hora em que disponibilizou o seu ombro amigo
para alguma desgostosa donzela lá desanuviar a alma quando deu por falta do
lencinho. Das duas uma: ou arrependido do ato mandou-a ir limpar o ranho para
outro ombro menos esquisito ou teve de voltar para casa com nojo do próprio
ombro, agora húmido dos desgostos alheios.
Não nos iludamos, pois, com o
valor das coisas. Algumas reduplicam o seu valor em certas horas para voltarem
ao seu estado costumeiro de invisibilidade quando procuramos quotidianamente
objetos que nos são caros, mas que são, pela sua idiossincrasia, incapazes de
nos tirar de apuros…
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